Reina uma certa insatisfação no seio das Forças Armadas (FA), motivada pelo incumprimento, por parte do Governo, na implementação dos Estatutos dos Militares, aprovados em Janeiro de 2020. Circulam rumores na parada, de “consequências imprevisíveis”, por causa do alegado descaso salarial do Governo em relação aos militares.
O novo Estatuto deveria ser implementado a partir de Fevereiro de 2020, mais concretamente em relação à actualização do índice 100, que deveria introduzir uma melhoria salarial dos oficiais, sargentos e praças da instituição castrense.
Esta deveria ser feita de forma faseada durante três anos: em 2020 o índice 100 deveria
corresponder a 15 mil escudos; em 2021, 16 mil, e em 2022, 17 mil escudos.
O índice 100 referente a 2020 entrou em vigor e os militares beneficiaram de uma ligeira melhoria salarial, contudo, segundo um oficial superior, em relação à actualização que deveria ser feita em 2021 foram informados, através do Presidente Jorge Carlos Fonseca, que a implementação do diploma seria suspensa durante esse ano, por causa da pandemia da covid-19.
OE não prevê actualizalção salarial em 2022
“Mas ficou o compromisso que em 2022 os Estatutos seriam implementados para o máximo de 17 mil escudos. Ao contrário daquilo que aconteceu no ano passado, por esta altura, quando o PR informou que em 2021 haveria um interregno na implementação dos
Estatutos, neste momento não temos qualquer informação oficial sobre o que acontecerá em
2022”, realça.
Contudo, para que essa actualização salarial seja implementada em 2022, a referida verba deveria constar da proposta do Orçamento do Estado (OE) que será aprovado no próximo mês de Novembro, no Parlamento.
“A proposta de OE para 2022 foi socializada e o nosso comandante de Logística os informou que o índice 100 não será elevado para 17 mil escudos. Isso sem uma explicação plausível, tendo em conta que o Governo já tinha garantido que, em 2022, o nosso estatuto remuneratório seria implementado na totalidade”, sublinha.
Descontentamento generalizado
Este oficial, que procurou o A NAÇÃO para manifestar a sua insatisfação perante aquilo que considera de descaso do Governo em relação à instituição castrense e aos seus efectivos, afirma que existe, neste momento, nas FA, “um descontentamento generalizado nos quarteis, a começar pelos oficiais superiores.
“Quem deve estar conformado é o chefe do Estado Maior, que, por ser o máximo responsável
de uma instituição como a nossa, não pode dar um soco na mesa”, acrescenta.
O nosso interlocutor afirma ainda que este “descaso” do Governo em relação à implementação do Estatuto das FA “tem gerado rumores na parada com consequência imprevisíveis”.
Perguntado que consequências imprevisíveis serão essas, este oficial diz que não sabe dizer
porquanto cada um pensa pela sua própria cabeça.
“Sempre são as FA a serem sacrificadas”
“Defendemos o amor à pátria, respeitamos a democracia, respeitamos as instituições da República, somos pela legalidade, e isso nos obriga a ficar quietos no nosso canto.
Mas, o problema é que os militares deram como certa essa atualização salarial e assumiram compromissos que terão que honrar, sob pena de a sua imagem vir a ser colocada em causa”, alega.
Para este militar, o moral das tropas fica também bastante afectado com mais este incumprimento do Governo.
“Sempre são as FA a serem sacrificadas. Nunca nenhuma outra instituição deste país foi tão sacrificada como a nossa, nem mesmo a polícia, que tem como fazer greve”. E como “não temos direito à greve, as vezes ficamos resignados, mas sem fazer barulho, porquanto temos amor à Pátria”.
Reestruturação do sistema remuneratório
De acordo decreto-legislativo nº 1/2020, que aprova o Estatuto dos Militares, é fundamental
reestruturar as bases do sistema de remuneratório, o regime de incentivo e regalias dos militares, redefinindo o valor do índice 100, criação de três níveis salariais em cada posto, de modo a incentivar o militar a manter no activo por mais tempo, o que passa, entre outras medidas, pela criação da tabela salarial para o posto de Cabo-Mor.
Mas que, infelizmente, o Governo vem falhando na sua implementação.
Entretanto, em Dezembro de 2020, o Governo publicou um Decreto Regulamentar, nº 15/2020, onde dizia que, perante o cenário da pandemia da covi-19, era impossível garantir o aumento do índice 100 para 2021, mas que manteria o valor definido para 2022.
Tentamos obter uma reação da ministra da Defesa sobre este assunto, mas Janine Lélis não atendeu o nosso telefonema.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 739, de 28 de Outubro de 2021