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Opinião

Que Igreja para o nosso Cardeal, num tempo de graça com 40 anos?

Pedro Moreira

No ano de graça de dois mil e quinze, de Nosso Senhor Jesus Cristo, habemos Cardinali, Sua Eminência Reverendíssima Dom Arlindo Gomes Furtado da Diocese de Santiago de Cabo Verde.

Para se ter a noção básica do cargo e das funções, melhor dito, do ministério do cardeal, reza assim o Direito Canónico: “Os Cardeais da Santa Igreja Romana constituem um colégio peculiar, ao qual compete providenciar à eleição do Romano Pontífice nos termos do direito peculiar; os cardeais também assistem ao Romano Pontífice quer agindo colegialmente, quando forem convocados para tratar em comum dos assuntos de maior importância, quer individualmente, nos vários ofícios que desempenham, prestando auxílio ao Romano Pontífice na solicitude quotidiana da Igreja universal.”

De surpresas em surpresas até o Cardeal

Quando no passado 4 de Janeiro, durante a oração do Angelus, na Praça de São Pedro, o Papa Francisco (PF) anunciou a escolha e a nomeação dos vinte novos cardeais, sendo quinze deles com o poder de eleição no conclave, ninguém aqui nas ilhas Atlânticas imaginava, sequer, ver ou ouvir o nome abençoado destas ilhas; nem mesmo o nomeado, estava à espera de ver o seu nome entre os príncipes da Igreja. Como sempre tem reafirmado o nosso cardeal nomeado, não é dele o merecimento por esta nomeação, o que nem deve ser visto numa perspectiva pessoal. É, sim, um expresso reconhecimento do percurso e crescimento de uma Igreja local muito específica no contexto africano, ao longo de quase quinhentos anos de história que conheceu momentos altos e de boas surpresas durante as últimas quatro décadas. Para mais, num país de matriz cristã, maioritariamente católica, e imbuído de valores cristãos, de que a Igreja Católica é portadora. Por outro lado, não podia ser mais claro, Dom Ildo Fortes, bispo de Mindelo, quando acentua, categoricamente, que a criação de um cardeal muda “a imagem, o prestígio e o papel de Cabo Verde” no cenário da Igreja Universal, passando a ter voz activa nas grandes questões da Igreja.

Como sempre e mais uma vez, a Igreja nos surpreende, como surpreendeu ao próprio nomeado, e como nos tem surpreendido tanto nos últimos 40 anos, novos e de graças, a começar, com a nomeação, em 1975, do primeiro bispo nativo em quase quinhentos anos de cristandade nestas ilhas do Atlântico. Depois, foi a eleição de Karol Woytila, o nosso sempre saudoso Papa João Paulo II, ele também vindo da periferia comunista da então Europa; ele que em 1990, fez agora 25 anos, foi o primeiro e, até hoje, o único papa que visitou e veio confirmar os seus irmãos na fé, neste fim do mundo. Não foi menos surpresa o tempo da criação da segunda diocese, a nomeação do primeiro bispo de Mindelo e a nomeação do novo bispo de Santiago na sucessão de Dom Paulino Évora. Tudo no tempo de Deus e da Igreja.

Na verdade, daqui a poucas horas, o bispo da diocese de Santiago de Cabo Verde, Dom Arlindo Gomes Furtado será consagrado cardeal da Igreja Católica em Roma pelo PF, quando no rito do consistório, este lhe entregar o barrete vermelho, o anel cardinalício e a bula de nomeação, depois da profissão de fé e do juramento de obediência à Igreja Católica, na pessoa do Papa e de seus sucessores, numa fórmula que, no dizer de Bento XVI, é “carregada de profundo significado espiritual e eclesial, se presta nestes termos: “Prometo e juro permanecer, a partir de agora e para sempre enquanto tiver vida, fiel a Cristo e ao seu Evangelho, constantemente obediente à Santa Apostólica Igreja Romana.”

Do programa para estes “dias cardinalícios”, consta que, no domingo, 15 de Fevereiro, o PF presidirá uma celebração solene com os novos cardeais, enquanto nos dias 12 e 13 de Fevereiro, realizar-se-á um Consistório com todos os cardeais, para reflectir sobre as orientações e propostas para a reforma da Cúria Romana. No dia 14 será o Consistório ordinário público.

É tempo de novos tempos para o nosso bispo, para o nosso novíssimo cardeal e para a Igreja em Cabo Verde; tempo para outras boas surpresas e de muitos desafios, no tempo de Deus e dos cabo-verdianos.

Uma Igreja para novos tempos (de saída e a caminho) de novas surpresas

Pelo que se sabe – como afirmou o próprio bispo -, até o momento, a Sua Eminência Cardeal Arlindo Gomes Furtado continuará no governo da Diocese de Santiago até novas orientações e instruções do Papa Francisco.

Entre outras, é normal que possa vir a ser necessário um bispo auxiliar para esta diocese, caso o agora cardeal acumular muitas funções em Roma, ao mesmo tempo que não se pode descartar, inclusive, a substituição de Dom Arlindo à frente da diocese com uma possível chamada à Roma, abrindo caminho para a criação de um novo bispo para a Diocese de Santiago. Tantas possibilidades que o futuro tempo e as surpresas de Deus poderão confirmar.

Mais do que nunca, mais do que nos últimos 40 anos, a Igreja em Cabo Verde, particularmente na Diocese de Santiago, que inclui a cidade da Praia, capital do país, pode ser chamada a “pôr-se a caminho”, numa atitude de uma Igreja missionária, em constante “saída”, e a preparar-se para novas surpresas e desafios. E, estando a caminho, há sempre coisas novas a encontrar. Como nos lembra o PF, “um caminho não é absoluto em si mesmo, é o caminho rumo a um ponto: rumo à manifestação definitiva do Senhor.” Afinal, esta diocese de Santiago de Cabo Verde, assumiu no seu Plano Pastoral para 2013-2016, um mandato de urgência, “Ide e fazei discípulos” (Cf. Mt 28, 19a), o que, na linha da (nova) Evangelização que esse imperativo impõe e para que o mesmo se realize, é ainda o mesmo documento que sustenta “ser necessário que os seus agentes mais responsáveis, bispos, sacerdotes, religiosos e leigos empenhados, estejam convertidos e abertos à ‘conversão pastoral’ de que tanto tem falado o PF; conversão essa que estabelece renovação eclesial inadiável quando, ainda é o papa que a propõe e exorta, nestes termos tão claros como expressivos. “Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo actual que à auto-preservação. A reforma das estruturas, que a conversão pastoral exige, só se pode entender neste sentido: fazer com que todas elas se tornem mais missionárias, que a pastoral ordinária em todas as suas instâncias seja mais comunicativa e aberta, que coloque os agentes pastorais em atitude constante de ‘saída’ e, assim, favoreça a resposta positiva de todos aqueles a quem Jesus oferece a sua amizade.”

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