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Economia

Gado em risco de extinguir

O preço da vaca e da cabra caiu mais de 40 por cento nas últimas semanas por causa do mau ano agrícola. Para evitar que os animais morram à fome e à sede – como já acontece no Fogo, Maio ou Santiago – os criadores estão a desfazer-se dos seus animais, não importa como. Há já o risco de acabar com toda a criação doméstica, pondo em xeque a actividade pecuária, um sector que cresceu bastante nos últimos anos em Cabo Verde.
Nos mercados a diferença é, neste momento, gritante: um quilo de carne de vaca de primeira, que antes custava 900 escudos, agora vale 400, menos do que um quilo de porco (500$00). Em Santa Catarina de Santiago pode-se até comprar por 350 escudos o quilo, seja lombinho ou carne de segunda. Mas, afinal, por que está tão barato o preço da carne? A resposta é simples: mau ano agrícola.
Sim, a escassa chuva que caiu em Cabo Verde este ano não só deu pouca comida para os agricultores como castigou o gado com falta de pasto e água. Em resultado disso, muitos criadores de caprino e bovino estão a “libertar-se” dos seus animais para não os ver morrer à fome.
“Não há pasto, nem água. Os animais estão a padecer, por isso só nos resta vendê-los de modo a não perder o investimento feito”, desabafa Silvino Gonçalves, criador de gado há mais de 20 anos em São Lourenço dos Órgãos, Santiago. O seu drama é extensivo à maior parte do país com muitos criadores a desfazerem-se da sua criação para evitar que os animais morram por falta de comida ou água.
Neste momento, segundo A NAÇÃO apurou, há zonas como Calheta de São Miguel, em Santiago, Maio ou certas localidades da ilha do Fogo, onde as vacas e cabras estão a sucumbir por falta de pasto. Na maior ilha do país – que tem o maior número de cabeças de gado – o cenário roça a tragédia. “Os animais estão a morrer à fome. Quem tem algum recursos pode salvar os seus, mas nós que dependemos da mera criação vamos perder todo o investimento”, conta Herculano Semedo, criador em Milho Branco, São Domingos.
Segundo esse criador, a manter-se o actual cenário, o gado corre sérios riscos de exinguir. “Repare, a pouca palha que existe é manifestamente insuficiente. E só ração não dá, isto porque vacas e cabras são animais ruminantes que precisam de erva para o seu metabolismo funcionar. Por isso, damos uma mistura de ração e palha, mas com a fraca chuva não temos onde buscar alimento para eles. Se não se fizer nada, daqui a pouco o preço da vaca pode cair para 15 contos, o preço de um porco”, lamenta, antes de acrecentar:
“O pior é que também não há água, pelo que muitos criadores estão a livrar-se dos animais, alguns vendendo por bagatela outros abatendo para vender a carne. Há criadores com mais de cem cabeças de gado que estão com as mãos na cabeça sem saber o que fazer. Temo que neste momento a população de animais de criação está a baixar para metade do qua havia em Santiago e vai continuar a diminuir”.
Semedo revela que só para este fim de semana, na zona de Nossa Senhora da Luz, sete famílias já anunciaram a venda de carne de vaca por 400 escudos o quilo. “Ou seja, são sete vacas que vão para o abate de uma assentada”, reforça, ao mesmo tempo que justifica a matança. “É a melhor solução, porque assim podemos recuperar o investimento feito. Só para ter uma ideia, uma vaca de 100 quilos era vendida a 60 ou 70 contos, mas agora compra-se por 40 contos ou menos. Se fizermos as contas verá que é insuficiente. Basta dizer que um animal adulto come por dia mais de 40 quilos de palha e bebe mais de 30 litros de água. Em um ano é muito dinheiro”, sublinha.
Para o açougueiro José Mendonça (Zeca), por ora, quem sai a ganhar com tudo isto são os consumidores. “Agora, com 2 mil escudos, um chefe de família leva para casa quatro quilos de carne”, analisa.
De acordo com aquele operador, o cenário é para mais reduções nos preços, tendo em conta a situação na ilha do Fogo. “As cabras estão a ser arrematadas logo no porto da Praia, à saída do barco, por cinco mil escudos, o que significa que foi comprado no Fogo por 3 mil no máximo”, diz, lembrando ainda que nesta época festiva haverá ainda maior procura e mais oferta.
Zeca chama também atenção para o comércio de carne sem controlo sanitário. De facto, grande parte dos animais abatidos foram-no em casas particulares e depois pendurados na carroçaria de viaturas caixa aberta que andam de povoado em povoado a vender carne, sem condições mínimas de higiene e sem qualquer respeito pela sanidade pública. Os carros circulam nas estradas principais do interior de Santiago na barba cara das autoridades, que muitas vezes fecham os olhos e noutras são os primeiros compradores.

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