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Ambiente

Sítio Agro-ecológico de João Varela usa “pesticidas” amigos do ambiente 

Já ouviu falar de agricultura orgânica? E de economia solidária? Imagine agora juntar os dois conceitos num só. Resultado: alimentação mais saudável e aumento do rendimento das famílias. Este é o conceito do Sítio Agro-ecológico João Varela, na Ribeira Grande de Santiago, uma iniciativa da Cáritas Cabo Verde e que tem vindo a conquistar lavradores para a prática de agricultura amiga do ambiente e cada vez mais clientes que procuram alimentos livres de químicos.
São cinco da manhã. Daqui a nada o dia começa a clarear. Enquanto na cidade da Praia é hora de muitos se levantarem para o seu jogging matinal, no sítio Agro-ecológico de João Varela, a menos de 10 quilometros da capital, a azafama é outra.
Maria Estevão Moreira, conhecida por “Jacinta”, é, quase sempre, a primeira a levantar-se. “Gosto de fazer o cuscuz e ‘bater’ o leite”, conta esta mãe de três filhos, natural de São João Baptista.
Aos 44 anos Jacinta é um dos 10 agricultores que tiveram a “sorte” de integrar o projecto deste sítio. Sorte, porque, para além de consegirem aumentar a renda familiar e ter acesso a uma vida mais condigna, adquiriram ainda o acesso a uma série de conhecimentos sobre agricultura orgânica e alimentação saudável.
Ademais, o sítio funciona com base na economia solidária, onde não entram químicos, pesticidas ou agrotóxicos. Tudo é cultivado de forma orgânica, incluindo os adubos utilizados para fertilizar o solo que são produzidos através do estrume animal, transformado em composto.
Mais naturais, saborosos e duradouros
Localizado a escassos metros da Cadeia de São Martinho, as instalações, que incluem para além dos campos uma residencial para os agricultores, estendem-se ao longo de 20 quilómetros de área que, outrora, muitos pensavam jamais ver brotar algum produto agrícola. “Diziam que eramos doidos, que aqui não nascia nada”, conta Marina Almeida, secretária geral da Caritas e coordenadora do projeto.
Na verdade, trata-se de um terreno que foi cedido pela Diocese de Santiago e que hoje, três anos depois de ter início a produção, todos reconhecem o sucesso do projecto, incluindo a população local que passou a ser também consumidora de produtos orgânicos.
“O cultivo orgânico é muito saudável e actualmente tem muita procura. Porque os produtos hortícolas que saem daqui conseguem manter-se frescos durante vários dias mesmo que não estejam no frigorífico”, garante Jacinta, enquanto nos leva num passeio pela quinta.
Princípios da economia solidária
Cerca de metade dos agricultores, mormente os que são de longe e, muitos deles, com família constituída, residem no sítio durante a semana, incluindo Jacinta. Por isso, o princípio da economia solidária aplica-se ao funcionamento da zona residencial. Curiosamente, até na tarde da visita do A NAÇÃO, sentaram-se todos à mesma mesa para partilharem conhecimentos e informações do projecto e para que todos pudessem dar a sua opinião.
“Todos têm tarefas a cumprir”, diz Marina. E as tarefas irão constar, depois, na caderneta de registos de cada um. Mas, como é que tudo começou e o que está por detrás de um projecto tão inovador e à partida único no país? Pois é, a ideia não foi fruto do acaso. Marina Almeida conta que na génese esteve outro projecto de auto valorização de famílias pobres, em São João Baptista, que depois da falta de condições para avançar nessa localidade surgiu a ideia de enveredar por algo ligado à agricultura.
“Também já tínhamos experiência em hortas familiares e tínhamos visto algumas experiências do género no Brasil”, recorda a coordenadora do projecto. Depois, a Caritas accionou alguns conhecimentos e recebeu apoio e assessoria de Israel, e não só, onde há projectos semelhantes, para arrancar com a iniciativa. Inclusive, depois os agricultores tiveram acesso a um conjunto de formações em agricultura orgânica, por parte de um técnico brasileiro.
Reflorestação
Inicialmente, houve um grande trabalho de desbastação e preparação da terra para agricultura, mas também de reflorestação, uma vez que se tratava de um terreno de pasto. Aliás, o conceito passa ainda pela reflorestação de toda a área e revitalização do local, para lá do projecto agrícola. Até agora, já foram fixadas “nove mil pés de plantas de 30 espécies diferentes, incluindo reflorestação das acácias”, revela a coordenadora.
Cada agricultor tem a sua parcela mas todos se ajudam mutuamente, entre outras funções, na altura de deitar as sementes à terra, na colheita, na manutenção, no tratamento dos viveiros e na lida dos animais. Para já, apenas 2,2 hectares estão actualmente em cultivo, mas as perspectivas apontam para a duplicação como meta a atingir.
A variedade de produtos é imensa. Batata doce, beringela, pimentão, papaia, byssap, cebolinho, rúcula, couve, etc. A estes junta-se ainda um leque de ervas aromáticas frescas com muita procura e saída no mercado da Praia. Alecrim, manjericão e hortelã, entre outros, que são cultivados na zona da “Mandala”.
Banana orgânica já começou a nascer
Mais recentemente, o sítio decidiu continuar a inovar e apostar no cultivo de banana orgânica. Ou seja, sem recorrer à utilização de quaisquer fertilizantes químicos ou adubos. Algo que alguns técnicos pensavam “impossivel” segundo Marina, mas que hoje já dá provas do sucesso. É que as primeiras bananas já começaram a nascer e o bananal está com muito “bom aspecto”. Juntamente com a parceria do INIDA, foram plantados 300 pés de bananeira, compradas ao instituto com 50% de desconto e ainda com instalação gratuita da rega gota a gota.
Depois da banana orgânica, não faltam projectos para o sítio Agro-ecológico de João Varela, a começar pela transformação de produtos e na secagem, por exemplo, da beringela, tomate e banana, para “aumentar a rentabilidade” e a “diversificação da oferta”.
Para além da agricultura orgânica, o sítio dedica-se à criação de animais, como vacas, codornizes (porque o consumo de ovos deste animal tem aumentado na Praia e está na moda) e cabras, entre outros. Os animais ajudam no estrume e contribuem para o equilíbrio das culturas e do ecossistema. Aliás, a passarinha ou a galinha do mato, são duas espécies que coabitam também na quinta.
Circuito de distribuição moderno
Um projecto inovador só poderia tentar apostar numa cadeia de promoção e distribuição moderna. Isso passa pelo acesso às novas tecnologias e redes sociais. Paula, responsável de vendas, clientes e divulgação do CV Orgânicos, criou uma página no Facebook onde começou a divulgar os produtos.
No início começou a funcionar o “palavra puxa palavra”, e hoje contam já com uma base de dados de cerca de 200 clientes cadastrados. O cadastro começou a ser feito em Maio, durante o lançamento da CV Orgânicos, na Feira Internacional de Agro-negócios de Cabo Verde. Mas, como é que tudo funciona? Todas as segundas-feiras, Paula envia um email para os clientes com a indicação dos produtos disponíveis para venda nessa semana. “É que nós respeitamos a época natural de cultivo dos produtos, por isso, nem sempre temos tudo”.
Depois de enviada a lista dos produtos disponíveis, com os respectivos preços, os clientes fazem os seus pedidos por email até às 17horas de terça-feira. Em seguida os pedidos são enviados para o sítio, onde Jacinta fica encarregue de coordenar os pedidos. “Os produtos são colhidos frescos todas as quartas-feiras de manhã, separados e levandos para a Praia, para a sede da Cáritas”, explica Paula.
Depois, os mesmos são levantados pelos clientes, à tarde, na sede. Com o aumento de hábitos de vida saudáveis, a nossa entrevistada revela que tem também tem “aumentado” a procura por produtos orgânicos. Na maioria clientes de classe média/alta, que usam a internet, mas também já há muitos locais de diferentes “classes sociais” que vão comprar “directamente” no sítio.
Os pedidos variam por semana, mas na semana desta reportagem tinham ultrapassados os 60 pedidos. “Além de saudáveis, são mais baratos”, avança essa responsável. Como o projecto se baseia num conceito ecológico, os clienes são incentivados a levar também bolsas ecológicas para evitar o uso do plástico.
 
 

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